quarta-feira, 23 de abril de 2008

O erotismo,ou a dialetica do prazer-Raoul vaneigem




Nao existe prazer que nao esteja em busca da sua coerencia.A sua interrupcao,a sua nao-satisfacao provoca um disturbio semelhante a estase de que fala reich.Os mecanismos opressivos do poder mantemos seres humanos em um estado de crise permanente.O prazer e a angustia nascidos de uma ausencia tem portanto essencialmente uma funcao social.O erotismo e odesenvolvimentodas paixoes que se tornam unitarias,um jogo sobre unidade e multiplicidade,sem o qual nao existe coerenciarevolucionaria "o tedio eh sempre contra-revolucionario"I.S

Wilhelm Reich atribui a maioria dos comportamentos neuroticos aos disturbios do orgasmo,aquilo que ele chama de "impotencia orgastica".Segundo ele,a angustia surge da incapacidade de ter um orgasmo completo,surge de uma descarga sexual que nao consegue liquidar totalmente toda excitacao mobilizada pela atividade sexual preliminar(caricia,jogos eroticos,seducao...)A teoria reichiana considera que a energia acumulada e nao gasta se torna flutuante,e se transforma em angustia.Aangustia por sua vez impede um orgasmo futuro.

Ora ,o problema das tensoes e da sua liquidacao nao se coloca apenas no plano da sexualidade,ele caracteriza todas as relacoes humanas.Mesmo reich o tenha pressentido,ele nao mostrou de modo suficiente que a crise social atual eh tambem uma crise de tipo orgastico.Se "a fonte de energia da neurose se encontra na disparidade entre acumulacao e descarga de energia sexual"

parece-me que a fonte de energia das nossas neuroses se encontra tambem na disparidade entre acumulacao e descarga de energia posta em acao nas relacoes humanas.O gozo total eh ainda possivel no momento do amor,mas assim que nos esforcarmos em prolongar no momento do amor,em lhe dar uma extencao social,nao se escapa aquilo a que reich chama"estase".O mundo do deficitario e do incompleto eh o mundo da crise permanente.Como seria entao uma sociedade sem neurose?Seria uma festa permanente.com o prazer como unico guia.


"Tudo eh feminino naquilo que se ama"escreveu La mettrie"O dominio do amor so reconhece como limites os do prazer"Mas o proprio prazer em geral nao reconhece limites.O prazer que nao aumenta desaparece.Arepeticao o mata,ele nao se acomoda com o fragmentario.O principio do prazer eh inseparavel da totalidade.

O erotismo eh o prazer que procura sua propria coerencia.Eh o movimento das paixoes na direcao da intercomunicacao,da interdependencia e da unidade.O problema eh recriarna vida social condicoesdo gozo perfeito no momento do amor.condicoes que permitam o jogo com a unidade e a multiplicidade,ou seja,livre,e transparente participacao na busca da realizacao.

Freud define a finalidade de Eros como a unificacao ou a busca de uniao.Mas,quando pretende que o medode ser separado e expulso do grupo provem da angustia da castracao,ele ve de modo invertido.E a angustia da castracao que provem do medo de ser excluido,e nao o inverso.Essa angustia aumenta a medida que o isolamento dos individuos na ilusao comunitaria se torna cada vez mais dificil de ignorar.

(...)Quanto mais o prazer cresce em intensidade mais reivindica a totalidade do mundo.Eh por isso que me agrada saudar como slogan revolucionario a exortacao de Breton"amantes ,deem um ao outro cada vez mais um prazer maior!"

A civilizacao ocidental eh uma civilizacao do trabalhoe, como diz Diogenes"o amor eh a ocupacao dos preguicosos".Com o desaparecimento gradual do trabalho forcado,o amor eh chamado a reconquistar o terreno proibido.E isso nao deixa de trazer o perigo para todas as formas de autoridade.Por ser unitario,o erotismo implicaa liberdade da multiplicidade.Nao existe melhor propaganda para a liberdade do que serena liberdade de gozar,Eh por isso que o prazer eh na maior parte do tempo confinadoa clandestinidade,o amor,em um quarto,a criatividade,debaixo da escada da cultura, o alcool.a droga,a sombra das leis.etc.

A moral da sobrevivencia condenou a diversidade dos prazeres e sua unidade-na-multiplicidade em proveito da repeticao.Seo prazer-angustia se satisfaz com o repetitivo,o verdadeiroprazer por sua vez so ocorre com a diversidade da unidade.O modelo mais simples eh o casal axial.Os dois parceiros vivem as suas experiencias numa transparencia numa liberdade tao completasquanto possivel.Essa cumplicidade irradiante tem o encantodas relacoes incestuosas.A multiplicidade das experiencias vividas e comum fundamenta entre os parceiros um laco de irmao e irma.Os grandes amores tem sempre alguma coisa de incestuoso:um fato sugere que o amor entre irmaos e irmas eh privilegiado a principio, e deveriaser favorecido.Ja eh tempo desse velho e ridiculo tabu ser quebrado,e um processo de "sororizacao" ser posto em andamento:ter uma esposa-irma cujas amigas sejam minhas esposas e irmas.

N o erotismo ,a unica perversao eh a negacao do prazer,eh a falsificacao do prazer-angustia.Que importaa fonte desde que a agua corra?Como os chineses dizem:imoveis um no outro,o prazer nos arrasta.

Finlamente a busca do prazer,eh a melhor garantia do ludico.Ele salvaguarda a participacao autentica,protegendo-a contra o sacrificio,a coacao,a mentira.Os diferentes graus de intensidade do prazer definem o dominio da subjetividade sobre o mundo.

Assim,o capricho eh o jogo do desejo em estado nascente:o desejo,o jogo,da paixao nascente.E o jogo da paixao encontra a coerencia na poesia da revolucao.

Isso quer dizer que a busca do prazer exclui o desprazer?Nao exatamente,mas o desprazer ganha um novo significado.O prazer-angustia nao eh nem um prazer nem um desprazer,mas um modo de se cocar que irrita ainda mais.O que eh entao o desprazer autentico?Um reves no jogo do desejo e da paixao:Um desprazer positivo que chama com um grau correspondente de paixao um outro prazer a constuir.

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